Em um clima de romantismo fantástico, o narrador do romance de André Breton percorre as ruas de Paris, como se fosse um mundo prestes a desaparecer, e se encontra com uma misteriosa jovem, Nadja. A certa altura, esta telefona para o narrador, que não está; a pessoa que atende lhe pergunta como ela pode ser encontrada; Nadja responde que ninguém a encontra.
Este é o resumo que se encontra na orelha de Nadja (Ed. Guanabara, 1987), de André Breton. Assim como a maioria das vanguardas do início do século passado, o Surrealismo rendeu mais manifestos do que obras, o que faria com que o romance publicado em 1928 se tornasse famoso pelo simples fato de ser uma obra declaradamente surrealista.
Experimental, o autor se confunde com narrador, faz de amigos seus personagens e o leitor não sabe até onde vai a realidade e começa o devaneio. Ficção e reflexões de cunho ensaístico e existenciais se misturam - psicanálise e fluxo de pensamento estavam na moda.
Um recurso interessante é a ausência intencional de descrições, que, como o autor explica no prefácio à uma reedição do livro de 1964, são substituídas por fotografias. Neste ponto é visível o caráter panfletário da obra, no sentido de que ela exprime uma necessidade das idéias contidas no Manifesto Surrealista de 1924 (redigido pelo próprio Breton) se concretizarem.
Na verborragia e humor afiado desse extenso manifesto, sobra até pra Dostoievski. A seguir, um trecho do livro, onde, ironicamente, Breton descreve Nantes:
Nantes: talvez seja, com Paris, a única cidade da França onde tenho a impressão de que me pode acontecer alguma coisa que valha, onde certos olhares queimam por seu próprio excesso de fogo (voltei a constatá-lo o ano passado, quando atravessava Nantes de automóvel e vi uma mulher, uma operária, creio, acompanhando um homem, e que ergueu para mim uns olhos que tive de parar), onde para mim a cadência da vida não é a mesma que em outros lugares, onde um espírito de aventura além de todas as aventuras habita ainda em certos seres(...)
15.7.09
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